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Janaina de Aquino


O trecho a seguir foi extraído da edição 2049, fevereiro 2008, da revista Veja e trata de uma entrevista feita com a atriz brasileira Alice Braga sobre sua participação no cinema americano. Entretanto, o foco aqui se dará a uma passagem que achei interessante, onde ela fala da sua relação com o inglês.

Veja – Em Eu Sou a Lenda, seu inglês chama atenção não só pela fluência, mas também pela pronúncia e entonação precisas. Você já falava bem inglês antes de começar sua carreira estrangeira?



Alice – Estudei inglês desde pequenininha. Hoje em dia agradeço a meu pai por sempre ter me obrigado a seguir as aulas, mesmo quando eu ficava com preguiça e inventava desculpas para parar. Mas, até trabalhar fora do Brasil, eu não falava com a fluência e a naturalidade de alguém que tivesse morado fora. Quando começaram a pintar essas oportunidades, voltei então a me dedicar à língua. Para Eu Sou a Lenda, tive um dialect coach, um profissional que ajuda não só a limpar o sotaque, mas, nesse caso, a melhorar a dicção e aprimorar a entonação. Quando uma pessoa fala uma língua estrangeira, ela tende a transferir sua entonação nativa para o segundo idioma – o que não só muda o sentido do que é dito como desvia a atenção do conteúdo para a forma, por assim dizer. A preocupação, então, era que minhas falas soassem claras e também naturais. Para isso, é preciso treinar até que todas essas regras se tornem inconscientes. Senão, na hora de fazer a cena, você só pensa no que está dizendo, e não na atuação, como deveria.

Muita gente abre a boca pra dizer que sabe falar inglês. E é exatamente neste momento que você percebe que ela não sabe nada, isto é, através do próprio inglês falado ou escrito por ela. Os traços que denunciam as falhas dessa pessoa podem estar na falta de fluência, vocabulário ou incompreensão do que é dito em inglês etc. Além disso, esses traços podem se apresentar como marcas. Em outras palavras, essas marcas são aquelas que fazem com que um ouvinte nativo da língua em questão, ou mesmo um conhecedor mais apurado desta, percebam - cedo ou tarde - muitas coisas sobre você, algumas delas já citadas, e outras como até de qual parte do mundo você é!

Por exemplo, tive dois professores falantes nativos da língua inglesa. Um era dos Estados Unidos, Califórnia, e outro do Reino Unido, País de Gales. O americano, no primeiro dia de aula, expôs uma lista de palavras no quadro, que se não me engano eram listen, write, speak e read, das quais nós tínhamos que escolher um par delas como reflexo do que expressassem nossa melhor relação com a língua inglesa. Assim, alguns, como eu, poderiam escutar e ler em inglês muito bem, mas não teriam alguma dificuldade maior ou menor em se expressar bem ou muito bem para falar ou escrever em inglês, entre outros casos. Já o segundo professor tinha um hábito bastante engraçado, ao falar qualquer coisa do Japão quando esteve por lá, de mostrar como os japoneses falavam inglês.

Eu classificaria aqui o primeiro exemplo como nossos traços, na falta de uma palavra mais apropriada e apenas para servir como ilustração nesta reflexão, no que se refere aos conhecimentos vocabulares daquele que aprende uma outra língua; o último exemplo ilustra como as pessoas carregam, muitas vezes inconscientemente, características da sua língua para outra. Por exemplo, quando alguém da região do Paraná, ao sul do Brasil, chega em Brasília e pronuncia a palavra ''porta'', o brasiliense irá escutar algo como ''porrlta", mas ele mesmo irá pronunciar ''porta'' (ou porrta, para alguns outros).

O mesmo se dá para um estrangeiro que fala inglês e escuta um brasileiro mais desavisado pronunciar ''kidi'' ao invés de ''kid''. Isso se dá porque o brasileiro tem tendência a vocalizar as palavras que deveriam terminar em um som mudo, como ''kit'' e ''Internet'', que são pronunciadas como "kithi'' e ''Internethi''. A despeito disso, uma professora de italiano disse-nos certa vez que, diante de alguns erros persistentes na pronúncia do italiano, não era preciso sair dizendo que era brasileiro logo de cara devido à maneira como falávamos italiano.

É claro que há maneiras de se corrigir e melhorar a maneira de que apredemos uma segunda língua a fim de diminuir os traços da influência da nossa língua materna, já citadas no trecho extraído do artigo da Veja, e outros que poderão ser tratados futuramente neste espaço. Porque, outra coisa que tenho observado, é mesmo que você fale com uma fluência incrível e tenha um vocabulário bastante amplo dessa segunda língua, o nativo uma hora percebe que você não é nativo as well. Não que isso seja um problema, mas quanto mais ele demorar pra perceber isso, melhor.

4 comentários

Patricia Ramos disse...

Bom, eu concordo plenamente com o que foi escrito aqui. Como eu trabalhei durante um ano com o ensino de línguas estrangeiras (no meu caso, apenas inglês e francês), pude passar a entender um pouquinho mais sobre fluência, facilidade de expressão, vocabulário, gramática, enfim... Todas essas questões que fazem parte do processo de aprendizagem de uma segunda língua. Tudo muito mais na prática do que na teoria...

Minha primeira surpresa foi perceber que muitas pessoas simplesmente não sentiam a influência que o português tinha na pronúncia delas, e até mesmo na entonação. É claro que o 'processo' todo era prejudicado por isso. Cansei de explicar para alunos de todas as idades que teacher não é tcheatcher e que book não é booki nos Estados Unidos e muuuuito menos na Inglaterra. E é incrível como todos eles acabavam percebendo a diferença quando viam algum nativo falando essas mesmas palavras.

A segunda - e maior - surpresa foi descobrir que eu não sabia tanto quanto eu pensava. Conviver com professores dos mais diversos lugares, com cursos diferentes e sotaques bem marcantes foram fatores que me fizeram perceber que eu ainda tenho muito, mas muuuuuuuuuuito a aprender. E é aí que a gente vê que anos de cursos, várias viagens para o exterior e a convivência com nativos podem até nos ajudar a aperfeiçoar nossos conhecimentos. O quesito 'fluência' é o mais beneficiado, sem dúvidas. Mas sempre vai haver um detalhezinho, aquela vogal no lugar errado, aquela entonação ligeiramente diferente que em fração de segundos vai nos denunciar.

Jana Ross disse...

"A segunda - e maior - surpresa foi descobrir que eu não sabia tanto quanto eu pensava. Conviver com professores dos mais diversos lugares, com cursos diferentes e sotaques bem marcantes foram fatores que me fizeram perceber que eu ainda tenho muito, mas muuuuuuuuuuito a aprender. E é aí que a gente vê que anos de cursos, várias viagens para o exterior e a convivência com nativos podem até nos ajudar a aperfeiçoar nossos conhecimentos. O quesito 'fluência' é o mais beneficiado, sem dúvidas. Mas sempre vai haver um detalhezinho, aquela vogal no lugar errado, aquela entonação ligeiramente diferente que em fração de segundos vai nos denunciar."


Isso que a Patricia disse é perrfeito. faz parte inclusive de um trecho que eu acabei excluindo do texto acima. Eu fiz anos de curso mas quando tive contato com nativos foi que percebi todas as minhas falhas e que não sabia nada. Chego a me recordar de um fato depois de um tempo aprendendo inglês, um professor que tinha morado na Inglaterra disse que a gente nunca pára de aprender uma segunda língua. Isso porque entramos em um outro assunto que merece discussão: a língua é um elemento vivo, assim como a sociedade, ela nunca pára; há palavras, expressões e até estruturas da língua que mudam de época pra outra e por isso precisamos estar constantemente atentos à essas ''mutações''.

Valeu, Patricia!

Unknown disse...

Patrícia!!!

Que felicidade ver você participando aqui! Muito legal!

Acho que falta maturidade e humildade de muitas pessoas para assumirem que não sabem!E esse é o primeiro passo para abrir a mente e estudar uma língua! Mas, de certa forma, a culpa não é totalmente delas!Como a Patrícia mesmo disse, é difícil a gente perceber o que tá fazendo e como tá fazendo! Lembro das aulas de morfosintaxe do inglês, as calouras, que ainda não tiveram um professor que lhes mostrasse que elas sabem bem menos do que pensam falavam 'readi', 'stuDi' e etc...
vários deslizes que, em função da experiencia com o ambinete universitário, em que o professor não passa a mão na cabeça e sim aponta os seus erros, aprendemos a identificar nos outros e em nós mesmos essas falhas nós aprendemos a perceber e corrigi. No entanto, era público e notório que eles não percebiam o que estavam fazendo e nem a forma como estavam falando, mas um dia eles vão amadurecer esse lado!

Com o tempo, fui reparando nos falantes nativos a entonação, que é, na minha opinião, o mais difícil de se adquirir e vi que esta é muito diferente da da língua portuguesa e que durante muito tempo transferi minha entonação da lingua materna para a lingua estrangeira e que ainda faço isso, mas que, aos poucos venho tentando melhorar e, o mais importante, eu consigo perceber quando estou fazendo isso!

No momento, venho estudando a língua espanhola e, apesar de ouvir a entonação da minha professora, que é nativa, eu simplesmente não consigo reproduzi-la! Quando estou falando em espanhol na aula, percebo que estou longe de alcançar aquela entonação, pois aprendi a reparar no falante nativo e assim, encontrar o que falta em mim! Dei o primeiro passo, reconheço que estou longe daquela entonação, mas vou treinar para adquiri-la!

Aproveito a oportunidade para comentar um fato...
Ontem estive em uma colação de grau e, no final, uma dessas
bandas estava tocando! De repente, uma mulher começou a cantar uma música em Inglês! Meu Deus! Como a pronúncia dela irritou meus ouvidos, além de, é claro, ela não conhecer a letra da música!
Tudo bem que, por ela não ser falante nativa da lingua inglesa ela cometa esses erros que devem ser considerados normais, mas, tendo em vista que ela trabalha com isso, ganha dinheiro com isso, acho que ela deveria pelo menos conhecer a letra da música que estava cantando, afinal, o repertório é selecionado anteriormente! Desta forma, ela não ficaria diminuindo o tom de sua voz nas passagens que tivessem palavras que ela não conhecia, ou não conseguia ler, ou não sabia pronunciar...

Luiz Felipe disse...

Gente, ela teve aula com o John !!!!