Adeus “Barbie”, olá “Fisimi”
Por Janaina de Aquino
Com a esperança de compensar a queda nas vendas nosmercados já tradicionais, atingidos pela crise financeira, a Mattel, maior fabricante de brinquedosdo mundo, inaugurou em Xangai, China, uma loja exclusiva para um dos íconesmais emblemáticos da empresa, a boneca “Barbie”.Contudo, as vendas não corresponderam às expectativas e a empresa foi forçada areduzir suas metas nos primeiros oito meses de existência da loja, segundorelata um artigo da BBC[1].
Figura 2. Mattel abre loja exclusiva para sua boneca “Barbie” na China |
Em março de 2011, dois anos após a inauguração da“loja dos sonhos”, que contava com seis andares contornados por uma escadariarepleta de exemplares da boneca (verFigura 2), fechar suas portas em HuaiHai Lu, uma das ruas mais badaladas e disputadas de Xangai, e fazer asmalas de volta para casa. Ou para a realidade. Pelo menos temporariamente, até aempresa reformular uma nova campanha da marca em todo o país, a ser lançada aindano fim deste ano. Seria essa campanha no formato de “awareness-raising” sobre a “trademarkBarbie” na China?
Bem provável. Nas palavras de Richard Dickson,vice-presidente executivo das marcas “Barbie”,“a marca não é mais uma boneca. A boneca é uma porta de entrada” (2011, sp.,tradução da autora)[2].Sim, pode ser uma porta de entrada, mas não quer dizer que é abre todas asportas também. Em uma declaração anterior, Dickson disse que “poderiam modelar a percepção da marca do jeito que quisessem”, mas, pelo jeito, a imagem daboneca por si só, não bastou para vender a marca, e precisarão adotar novasestratégias.
Ao inaugurar sua loja em Xangai, a Mattel considerou que a (suposta) fama mundial da boneca, carro-chefe da empresa, dispensava quaisquer apresentações. No entanto, Ben Cavender, especialista nas tendências do mercado chinês,observa que a “Barbie” tem umahistória muito antiga nos Estados Unidos, onde as pessoas crescem com a marca,seus pais cresceram com a marca e por isso o reconhecimento da marca é muitogrande. Na China, porém, ninguém sabia realmente o que a Barbie representava” (2011, sp., grifos da autora). Com algumaironia, as bonecas “Barbie” sãofabricadas na China e na Indonésia, de acordo com a Mattel.
Mediante o fracasso, se em algum momento a Mattel se perguntou, e é óbvio que seperguntou, “onde eu errei?”, certamente não demorou a perceber que seu erro foinão reconhecer as especificidades desse mercado. Leia-se “especificidades” como“características locais” da região, em que o comportamento e preferências deconsumo da população chinesa não foram devida ou adequadamente explorados pelosinvestidores e publicitários da empresa.
Figura 3. Interior da loja da Barbie na China |
Fica evidente que a estratégia anterior,aparentemente guiada pelos motes “Americanway of life” e “American dream”,muitas vezes atrelados aos produtos advindos dos Estados Unidos para promoveros produtos nos mercados externos e, neste caso, personificados na boneca loirade olhos azuis e seus apetrechos cor de rosa, gloss e gliter, não foi suficiente para alavancar as vendas da boneca.Entretanto, na China, esse tipo de padrão está longe de ser comum. Convocaram “Lin”, a amiga chinesa e idêntica à “Barbie”, exceto pelos olhos cabelos eolhos escuros. Não convenceu.
Não se pode dizer, contudo, que a Mattel ignorava completamente anecessidade de estratégias de atrair a atenção e o interesse da população local.A empresa sabia, por exemplo, que a atual geração de mães e avós chinesas não tevea oportunidade de brincar com a boneca na infância, e, por isso, o público-alvoda loja eram mulheres de 20 a 30 anos. Além disso, escolheu a cidade de Xangai,conhecida como um “mercado teste”, isto é, muitas empresas se instalam nacidade antes de iniciar sua expansão no resto da China. Se os negócios emXangai não forem bem, a probabilidade de fracassarem em outras cidades chinesasé a mesma.
Outra precaução tomada pela Mattel foi certificar-se que o nome “Barbie” seria associado somente às suas bonecas, pois, na China, apalavra “Barbie” (“wawa babi” em mandarim) é freqüentemente usada de formagenérica para se referir a qualquer tipo de boneca, como a “Shanghaiist”, uma das 56 bonecas“étnicas” criadas para representar os grupos de minoria na China, como na Figura 4 a seguir.
"Shanghaiist": boneca "étnica" que representa grupo de minorias na China |
No entanto, essa questão passou despercebida ou nãorecebeu a devida atenção pela Mattel.De acordo com Yu Tianyu, do jornal “DailyChina”, “não raro, as meninas chinesas perguntam aos pais por que suaboneca favorita tem traços diferentes dos delas”. Até então, as bonecas deolhos azuis e cabelos loiros, chamadas “yangwawa”ou “bonecas estrangeiras” dominavam o mercado. Para lutar contra essainfluência estrangeira, Tianyu relata que Ju Xia, do alto escalão de uma firma de Hong Kong, está realizando aambiciosa tarefa de promover os contos de fadas criados localmente a partir da coleção “Fisimi”, que significa “bênção” e “compartilhar boa sorte” em chinês.
Utilizado para se referir também a “Barbies chinesas”, o nome “Fisimi”[3] foiformado a partir das primeiras letras das palavras “cinquenta e seis”, que representa os 56 grupos étnicos da China, e “Minzu”, que significa “étnica” em mandarim, explica Tianyu. Assim, as “Fisimi”revelam que a população chinesa tende a resistir às forças da globalização, deforma a preservar sua cultura de milenar e de suas populações locais através da valorização de produtos que tenham o “jeito e a cara do seu povo”.
A Mattel anunciou que pretende abrir outras filiais da marca em outros mercados emdesenvolvimento, como países do leste europeu, Rússia e Índia. Caso tenha aprendido a lição, desta vez a empresa estará mais atenta às necessidades e demandas individuais desses países.
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[1] Para saber mais, acesse: Mattel shuts flagship Shanghai Barbie concept store. Disponível em:. Acessado em 04 de junho de2011.
[2] Texto em inglês: “The brand is no longer a doll. The doll is a gateway,”
[3] Para saber mais: Goodbye Barbie, hello Fisimi. Disponívelem. Acessadoem 06 de junho de 2011.
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